quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

LESTE DE ANGOLA - 16

Memórias de um passado saudoso


1972 – 20 de Dezembro, 4ª-feira, 28º. dia de viagem por terras de Angola

Benguela – Mais uma vez de boleia, inicio uma longa viagem por terras de Angola. Parto numa carrinha “Peugeot”, e sigo para o Lobito. Aqui, por indicação simpática e amigável duma jovem estudante, sou dirigido para o melhor local de “apanha boleia”.
Rumo ao Norte, num “NSU”, tentando chegar a todo o custo a Novo Redondo, (Sumbe), mas este tipo de viatura, frágil por sistema, não era o mais apropriado para percorrer grandes distâncias e sob as temperaturas africanas… Daí, a sua avaria mesmo na etapa final que, por sorte, acabámos por ser rebocados até à cidade, por um camião.
Esta povoação, embora sendo a capital do Cuanza Sul, pareceu-me à época, como que um pequeno aglomerado de casario. Centro piscatório, com algumas avenidas ainda por asfaltar, deparou-se-me inferior à grandeza das outras cidades Angolanas. Assim, não me demorei na visita, e num “Jeep”, desloco-me para a próxima cidade onde pretendia visitar mais uma das minhas correspondentes.

Mercado
No percurso para Gabela, avistei as graciosas cascatas do rio Quiéve, plantações de bananeiras, algodão de regadio, café, palmeiras, cactos e embondeiros.
Chegado a Gabela, percorri a mesma sem grandes demoras pois, para minha tristeza, não tive a sorte de me encontrar com a desejada cicerone. Nesta, como noutras situações, quando a saudade me batia à porta, recorria às imagens de algum filme projectado nos Cineteatros afamados da localidade. Cinema, Banco de Angola, Mercado, Rádio Clube, Igreja – eram como que pontos de principal referência dos aglomerados urbanos, cidades que correspondiam a pequenas vilas de Portugal.
Cascata do rio Quiéve
Sem animação, faço-me à estrada e apanho mais uma das dezenas de boleias já conseguidas. Num camião, conduzido por um afável negro, palmilho mais uns quilómetros. Pelo caminho, almocei num daqueles entrepostos rodoviários situados entre Quibala e o Dondo – vilas por mim visitadas no início da minha viagem. Quibala, pelo célebre cemitério indígena, mito de muitas lendas e, o Dondo, famoso pela barragem de Cambambe – a maior de Angola.
Desta barragem, derivava um canal comprido carregado de água, cuja velocidade de caudal atingia os trezentos quilómetros à hora. De enorme declive, passava por turbinas e despenhava-se num precipício, reencontrando o rio Cuanza espraiado e mais calmo na sua longa planície que o transportava até ao mar, junto a Luanda – Barra do Cuanza.
No fundo da ravina onde o maralhal das águas se entrechocava, fixavam-se os crocodilos ávidos das suas presas já mortas. Aqui, a busca de alimento era fácil de obter. A força e o despenhar das águas ajudava a manter a fauna.
Pela importância estratégica, esta barragem era protegida por militares do exército, e foi o seu capitão que se prontificou a percorrer todo o circuito para me fazer compreender a grandeza de semelhante obra.
Seguindo os morros encurvados da serra – os morros de Salazar, tento chegar e alojar-me no “My Friend”, uma das residências de N´Dalatando. Era esta a residência que mais frequentava aquando das minhas visitas à cidade para namorar a cachopa Angolana. Na altura, fazia dois mil e quinhentos quilómetros por três dias de estadia, e a viagem era feita num “Nord-Atlas” barulhento e num comboio, tipo cobra. Henrique de Carvalho, Luanda, Salazar, Luanda, Henrique de Carvalho.
Já na sexta-feira, de manhã cedo, arranco para Malanje. Mais uma viatura de transporte, “Diane-6”, mais umas largas dezenas de quilómetros e, eis-me na grande e antiga cidade. Esta, foi a que deu guarida ao célebre explorador Henrique de Carvalho, ao famoso “Zé do Telhado”, cuja sepultura ainda era venerada pelos indígenas locais, e ao conhecido Padre Américo.
Sempre em movimento, percorri grande parte das avenidas, jardim, e revi alguns locais por mim já visitados numa outra deslocação que tinha feito por ocasião duns exames a disciplinas do sétimo ano. Aproveitei para visitar plantações de girassol, tabaco e sisal, e não me alongando muito por estas paragens, regresso a Salazar, na ânsia de me reencontrar com a minha correspondente número um, e seus familiares.
Estávamos nas vésperas de Natal, e a época era para confraternização.
Cambambe
Bipartido em ficar em Salazar ou, viajar para Luanda – optei por reaver o meu amigo Zé Soares, na capital – a Luanda dos nossos sonhos…
Dia 24 de Dezembro, deparo-me com o “Bacalhau”, e com grandes abraços, festejámos o encontro e contámos o recheio de aventuras. Estávamos na Ilha - local por todos nós conhecido.
Já no “Pó-pó” da tia, combinámos passar a quadra festiva em casa dos seus familiares – recordação que recentemente despoletámos e que ainda lembramos com imensa saudade.
No presente momento, (quadra natalícia), perfazem-se trinta e oito anos após o Natal de 1972, passado em Luanda. Nessa altura, éramos dois jovens entusiastas e aventureiros… Agora… eu, pelo “Putezito” – ele, nos “Brazuca”, no seio da família que nos acolheu. Somos mais velhos…
Por aqui me fico nesta viagem que durou trinta e dois dias, alguns dos quais passados na Capital buliçosa.
Deixo-vos com uma fotografia conseguida na esplanada do sexto andar da Messe dos Sargentos, situada na Avenida dos Combatentes.
Nesse tempo… era assim a Avenida, com os seus carros, prédios – um cheirinho a preto e branco! Uma direcção para os bairros do Marçal e B.O.. Lembram-se?
Luanda, de outrora -- qual a comparação?!
O Majestoso Embondeiro
Até Breve
O Amigo Vítor Oliveira – OCART