sábado, 15 de dezembro de 2012

SAURIMO - "CONVERSAS NA CIDADE" - III



Nota Introdutória
     Os “especiais” e o novo companheiro encontravam-se no “Lux Bar” a curtirem a folga da Base…
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Marrador - O Vito, o Joca e o Quim tinham satisfeito as primeiras necessidades…as que entram, não as que saem. Comidos e bebidos deparam-se em acertar com a porta do “Lux Bar”. Ainda houve um dos “especiais” que traçou com o taco do bilhar o azimute do jardim frontal…, mas as mentes andavam turvadas – causa do líquido amarelado. Bem, as moelas e os “pi-pis” tiveram que ser regados a primor pelo efeito do carrego do gindungo!...
- Vamos seguir os nossos “artistas” e ouvir a “canção da Amélia”…
VITO - Amélia…Am…Amélia…
JOCA - Estás a cantar, ou a ladrar?
VITO  Zungo!...
QUIM – “Moio” aos dois. Tenho encontro marcado noutras paragens!...
VITO / JOCA – “Moio Ué”. Porta-te bem e aprende a agarrar o “taco”.
JOCA - Essa foi forte !...
VITO - Então, levou “cossa” no bilhar – mereceu duas derrotas!
JOCA - Amélia dos olhos doces… tá…tá…tá…
VITO -  … tá…tá…-tá… gaivota, amante, poeta…
VITO / JOCA -  … Rosa de café, Amélia gaiata, do bairro da lata, do Cais do Sodré… tá…tá…tá…
VITO - Passamos uma tangente à casa da Amélia?
JOCA - Yes, meu. Essa linda “Tusula”!... Depois, deitamos uma espreitadela pelo ambiente do “Estrela D´Alva”. 


Marrador - Bem, estes “especias” iam a seguir as pisadas sob a influência do instinto. Saíram do “Lux Bar” e, à sua frente deparou-se-lhes o jardim e as Bombas de gasolina. Inclinaram à esquerda, cruzaram a Avenida que seguia para a Capela, e estacam junto à casa da Amélia.
VITO – É…é…é…aqui!...
JOCA – Hehhh!
VITO – Alguma abelha te ferrou no “munhenho”?
JOCA – Topa a cena daquele mirone na pista de carros.
VITO – Treme, treme com as pernas junto à “muchacha”…
JOCA – É o Oliver, sargento das ágatas….
VITO – O próprio… e parece que esteve de quarentena lá em casa!....
JOCA – É como os cegos. Vêm com o tacto…
VITO – E apalpam com os membros inferiores?!...
JOCA – Com o membrito? Malandreco!...
VITO – O olhar dele está barrento. A mente está presa ao instinto!
JOCA – Qual das três te deu volta à cabeça? A Eka, a Nocal ou, Cuca?
VITO – A…N…D…O…R!... Antes que venha a “calunga”. Temos “maningue” que fazer.
JOCA – Passamos ao largo do “Estrela D´Alva”. Miramos a paisagem e não iremos entrar.
VITO – Tens receio dos bifes de “ferro”? Bem, tem umas instalações hexagonais e recatadas!... Longínquas do reboliço!...
JOCA – Pois, - há outras paragens prioritárias, por agora…
VITO – Hummm…Humm! Olha que este caminho só nos leva ao cemitério, ou à Barragem do Capelão?!... Para isso, teremos que passar pela sanzala…e dançar um “merengue” na “cubata” gigante.
JOCA  Curvamos. Há jogo no Estádio e os nossos “sorjas” vão “jogatinar”.
VITO – Mas primeiro estacionamos em frente da Capela para mirarmos as “modelos”.
JOCA – Queres ver a Amélia e as amigas… Ainda te prendes pela cidade do Carvalho – do Henrique de Carvalho.
VITO  Tenho saudades do “Puto”, mas a que lá deixei…deixei!...
JOCA – Lamúrias. Traz a “Mauser” e vamos caçar. Araras e leoas não faltam nestes lugares.
Marrador - Pé, ante pé, os nossos amigos seguiam pela Avenida da Capela. Do estacionamento das Carreiras provenientes do Luso e do Dundo, prosseguiram até ao largo dos Correios. Passaram pelos cruzamentos que davam para a Colectividade de Saurimo onde o Capelão ensaiava o seu grupo teatral, pela casa comercial de artesanato do sogro do assassinado Carvalho, pela escola de condução onde muitos companheiros tiraram a carta, Liceu e Avenida das mangueiras que finalizava numa velha Missão de religiosas, no caminho para a piscina. Estacaram no muro da Capela.
VITO – Aqui. Aqui junto a estes camaradas de armas.
JOCA – Olha, olha o Meteo-Gonçalves que há muito tempo não lhe punha os olhos em cima.
GONÇALVES – Ehhh…pessoal. Tudo nos “gungungos”?
VITO / JOCA – Bruxooo.
VITO – E que tal lá pelas bandas do Cazombo? Muitas “mulecas”? E a joia da coroa?
JOCA – Passou-me essa!... Joia da coroa?
VITO – Sim, a mascote elefante que ele e outros adoptaram no Destacamento.
JOCA – Elefante? Mascote? Dorme convosco?
VITO – Dorme, dorme…Meia caserna ficou no exterior…ao cacimbo! 


GONÇALVES – Não é bem assim, mas quase. Para lhe darmos banho tivemos que fundir três banheiras. Para comer, assaltámos as bananeiras dos arredores. Segue-nos a cada canto e todos os dias cresce aos palmos. Ainda a vamos treinar para fazer filmes com o Tarzan!...
VITO – A…a… é do sexo feminino?
GONÇALVES – É a nossa menina e tem uma história macabra!
JOCA – Este maralhal está aqui com a “peida” arreada no muro a fazer o quê?
GONÇALVES – A calejar o “munhenho” ou, a ver a missa. Não topas as ratoeiras à entrada da Capela?
VITO – Uihhh…Uihhh… Eu a pensar que estavam à espera de ver passar o Governador!...
JOCA – Ou, a Amélia e as suas manas. Este jardim dos CTT, é o encanto mais visitado…
GONÇALVES – Meninos, vamos à bola. Os “sorjas” vão iniciar a jogatina no pelado dos mangueirais.
VITO – No campo das abelhas?
JOCA – Nesse campo em que foram todos picados?
GONÇALVES – Não há outro! E as abelhas foram mortas a tiro.
VITO – A tiro? Então está ligada àquela história do mel recolhido com caju à mistura?
JOCA – Caju…de chumbo.
GONÇALVES – Vamos gritar pelos FAP. Hoje, a PSP vai perder. Temos lá os nossos vizinhos Ocart´s. Tudo sob controlo…controladores…terrestres.
VITO – No campo ao lado, também haverá um jogo de futebol de salão com os “especiais”.
JOCA – Isso é no cimentado. Vamos dum lado para o outro. 



VITO – E…acabaremos no Clube do Cinema, no velho Chikapa.
GONÇALVES – Mas…cinema…hoje, não.
JOCA – Porquê?
GONÇALVES – O projectista passou por nós…a cambalear…
VITO – Então teremos o filme a começar do fim para o início?
JOCA – Como sempre…Curiosamente a sala de cinema foi construída com o soalho em plano inclinado…invertido.
VITO  Sim, o soalho sobe para a tela!... Por isso, as cadeiras andam sempre a dançar para tomarem posição.
GONÇALVES – Não estiveram cá na última sessão?!… O pessoal do exército partiu o “cadeirame” todo só porque o “camera man” começou o filme pelo meio. O “Asa Negra” obrigou-os a cravarem uns pregos nas cadeiras partidas e a retomarem o filme de trás para a frente. Foi um castigador!...
VITO – Nem tanto. O filme de trás para a frente…já era costume!
Marrador: Nesta “lenga-lenga” caminhava-se pela Avenida dos CTT. Esta, trepava, trepava até à rotunda…lá longe.
Abandonaram a estátua do sertanejo. O recipiente das nossas cartas, a encruzilhada no jardim, os bancos namoradeiros, o Palácio do Governador, a Capela, o Clube, O Cinema, os campos de “futebóis”, as abelhas e as mangueiras.
Voltaram costas a tudo isso…por momentos!
Foram simplesmente matar a sede ao “Bar dos passarinhos”, e comer uma passarinha nas proximidades do “Quioco” ou, da “Cubata”. Vamos esperar para o próximo relato para indagarmos o destino da rota incerta… A cidade seguia o seu movimento de rotação?!... Bem, vou juntar-me aos gajos para lhes escutar a conversa! Calhando, … o movimento é outro!... 
Língua Quioca   
Zungo – Cala-te
Moio – Cumprimento
Tusula – Rapariga
Calunga – Chuva
Munhenho - Cu

Anotações:
Amélia – Jovem cidadã de H. de Carvalho que veio a casar com companheiro da Força Aérea
Oliver- Nome fictício, sargento R.D.  da FAP, casado e radicado na cidade.
Mascote – Pequeno elefante adoptado no Cazombo. História a recolher do Gonçalves – Meteo
Campo das abelhas – Abelhas soltas pelo campo das mangueiras no momento de jogada.
Asa Negra – Comandante do exército com histórias peculiares

Fotografias:
Recolha do “nosso” Blogue
  

Até Breve
O Amigo


segunda-feira, 15 de outubro de 2012

SAURIMO - "CONVERSAS NA CIDADE" - II


Nota Introdutória
Com proveniência da Base e chegados à cidade para uma estadia de várias horas, os nossos convidados “especiais” encontram-se precisamente no cruzamento do “Hotel Pereira Rodrigues”.
Uma das avenidas, seguindo para Ocidente e passando resvés à “Fotolux”, caminha para o cinema “Chikapa”. Outra, projectando-se para Norte, reflecte uma paralela ao pequeno jardim do Hotel, dando rumo ao velho mercado e ao bar do “Estrela D`Alva”. Do Sul, acabou de chegar a carrinha da Base com os seus “veraneantes”, e para o Oriente, apenas a picada junto aos quartos do Hotel – atalho que servia aos destinos dos edifícios dos Correios, Palácio do Governo, Capela e Rádio Saurimo.
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Marrador – O Vito e o Joca despertos para darem “guiso” à língua, chegaram à tal dita “Las Vegas”. Na encruzilhada do “fala-fala”,… e nada se diz, no local próprio das “calhandrices”, e de “peito feito”- tal e qual como dois galitos da índia se tratassem, eis que afinam o “lamiré”, mas num tom mais citadino …,… elegante para a “gente da Alta”. Vou dar corda aos falantes…
VITO – Hummm…Humm…
JOCA – Temos boi?
VITO - Lá estás tu!... Não estás a ouvir o “quissanje” a tocar?
JOCA – Bruxooo… Há batuque na esplanada, e já sei porquê…
VITO – Estou à espera… Dá à língua.
JOCA – Não ouviste falar no casório do Dinis? Trata-se do seu casamento, e os “toca-toca” são o grupo da Base. Os da “FAP”
VITO – O quê?! Os do “Cacimbo”?
JOCA – Yes, meu! E têm como Maestro, o celebríssimo Bilinhos a dar à “guita”.
VITO – Hummmm…
JOCA – Lá estás tu a chamar a “vaca”…
VITO - Escuta-me os acordes das guitarras, retira-me os “bemóis”, conjuga-me os “sustenidos”, e o que é que te fica retido nos tímpanos?
JOCA – Eh pá…Eh pá… Há uma certa desafinação!... Talvez alguma guitarra com cordas de marinheiro ou, “nocal” em excesso?!...
VITO – Olha! Olha o “IIM Careca”!... Saca-lhe novidades.
JOCA – “IIM Careca”? Estás a ficar gago ou, com a garganta seca? É o QUIM. Se falasses em alhos – já lhe tinhas colocado o “Q”!...
VITO – Ehhh… Quim. “Tweia kuno ao Muata”.
JOCA – Com esses termos quiôcos…ainda chateias o “especial”.
VITO - Só estou a chamá-lo. Estamos na Terra dos “Lunda”.
QUIM – “Moio Weno”… “Gungungo”?
VITO – “Moio”… ainda conheço!...Agora, com feno?! Só se for aqui para o Joca !...
QUIM – “Moio Weno” é um cumprimento mais completo em “Quiôco language”. E “gungungo” – é a perguntar se estão com força e sadios.
JOCA – Estamos sadios. Com força?! Nem tanto! Aqui o Vito está a ficar gago e precisa de molhar a goela…e amolecer o feno!
VITO – Quim, dormiste no “Hotel Palhota”? Eu, e o Joca, fomos os primeiros a chegar à cidade e tu já cá te encontravas…Estadia no “quimbo”? Por isso…é que sabes falar bem o “matumbo”!...
QUIM – Estás a ver miragens. O melhor é irmos às “cucas” para o Lux Bar.
JOCA - Já vamos. Vou chamar aqueles “canhicas” para me engraxarem os sapatos. Quero cruzar as pernas e mostrar as “ferraduras” sem timidez.
VITO – Bruxooo. Acertaste na “mouche”. Também quero. Oh Quim, aguarda pela malta. Oh… “xacala”, vem cá ao “Muata”. Quanto levas pela graxa? Quanta “falanga”? Vá…tu, e o teu mano, vamos ver quem é o melhor, mais rápido, e cantante.
JOCA – “Canhica”, quero música com o pano. Ginga, puxa, puxa…
VITO – Este sim! Até põe “sustenidos” no bater do pano. Ehhh… “cambutinha”!... Pareces um barrote queimado, mas trabalhas bem. Puxa…puxa…
QUIM – Até bato o pé … para acompanhar o batido do pano… O Conjunto aqui em baixo é melhor do que o do casamento! As notas musicais da esplanada estão a sair como bolas de sabão… Poc…poc…poc…
VITO – Meninos, já chega de tanta “cuspidela” no pano. Apanhas-me distraído, e da graxa – só sai cuspo? Toma cinco “falangas” e não digas que vais daqui…O quê? “falanga Kake”? É pouco?!
JOCA – Deixa. Eu dou mais cinco “falangas”. “Moio”, “moio”. “Zungo Kawaxi”.
QUIM – Um dos “canhicas” disse “tuje”!...
VITO – Aihhh… O Joca perguntou-me há momentos se tínhamos boi. Agora, Os “matumbos” dizem “muge”?!...
QUIM – “tuje”…”tuje” – “bull shit”!...
Marrador – Nesta “lenga-lenga” de encruzilhada, lá se ia passando o tempo duma forma descontraída, antes de se deslocarem para outras paragens. E que paragens? Mais metro, menos metro, e esbarrava-se com as sanzalas, com os musseques e os quimbos!... Deambulava-se de canto, sobre canto – na conversa fiada!...
VITO – Há tempos atrás fui apanhado neste local…com uma pinta do caraças!...
JOCA – Deram-te os gases?
VITO – Não. Mas fiquei azedo que só me deu vontade de tirar o “cabaço” à filha do pedreiro.
QUIM – Do pedreiro da Base?
VITO – Sim, sim. A que trabalha no Rádio Clube Saurimo. Olha!... colega do Dinis… Essa linda, como uma “tusula tchibandala”. Telefonou para a Base a querer falar comigo. O telefonista, nosso conhecido, encaminhou a chamada para mim a dizer que se tratava duma donzela que me queria segredar. Afiei a “dentola”, parafinei o “pífaro”, afunilei o bigode, insalivei a garganta, e numa voz suave e doce…anunciei-me. “Faça favor de se espremer”… falava assim o galanteador!... Ela, meigamente, com uma voz de derreter aço, convenceu-me a esperá-la neste local à frente de nós. Aqui, no jardim do Hotel, às 15:00 h, defronte daquelas janelas dos quartos do “Pereira Rodrigues”.
JOCA e QUIM – Vieste cá?
VITO – Vim. Quem não teria vindo? Com aquela voz – até me achei o “Elvis Presley”!...
JOCA e QUIM – Não pares. Acaba a “marração”. Talvez nos arranjes companhia para trincarmos as “moelas”…
VITO – Esperei … esperei … e já cansado e com o pescoço pendente de tantas curvas voltear – desanimei. Quando me desloco para sair da “ratoeira”, eis que lá de cima do Hotel oiço uma risada desenfreada. Era a “mula” com a pança cheia de gozo….
JOCA – Caíste? E as colegas a curtirem, também?
VITO – Deixa, deixa, que ainda lhe abato o “cabaço” e não pagarei nada ao “soba”.
QUIM – Não te aborreças com essa. Num baile do “Chikapa” fui para a convidar para uma dança, e quando ela se levantou da cadeira, gulosa para me abraçar, dirigi-me para a colega do lado e tomei a outra como minha dançante.
JOCA – Deste-lhe uma “tampa”?
QUIM – Das grandes. Parecida com a “Carlota” da feira – aquela que vende rifas!… Para gozona, gozona e meia…
VITO - Gozona, e…toda!. Toda, e no “sundji” dela.
JOCA – Maldoso!...
VITO – Vamos, vamos à “cuca” e à “nocal”, ali no Lux Bar. Depois, das “moelas”, comemos uns “pi-pis” com “gindungo” a valer. Segue-se uma “bilharada”, e tomamos rumo ao “Estrela D`Alva” ao encontro dos “Neves” – companheiros de estrada batida.
JOCA – Já me está a dar a “nzala”. Só “fominha” amarela!...
QUIM – Atacamos! Ainda mal nasceu o dia…e já vai longa a “cavacada”!...
Marrador - A poucos metros do cruzamento, situava-se o famoso Lux Bar, na avenida de maior circulação. Neste lado da avenida e até ao dobrar de ambas as esquinas, ficavam nos prédios de dois andares; a Foto Lux, o Banco, lojas comerciais diversas. Defronte, tínhamos o jardim com arvoredo crescido e alguns bancos. Caminhando para o Norte, a poucos metros e no topo do jardim, saía uma perpendicular de estrada oriunda do velho cinema “Chikapa” e Capela – com seguimento para a direcção do Oriente, Bar das Bombas de gasolina, (Mobil), Luso.
O segundo destino dos nossos “capangas” seria o “Estrela D´Alva”, e para isso, teriam que descer a avenida, cruzar com a via da Capela-Luso, passando a roçar pela paragem dos camiões e autocarros de passageiros, pelo velho mercado indígena e pela Casa de Circunscrição Florestal de Angola … onde morava a belíssima Amélia, a de cabelos loiros...loiros de arrepiar. Apre….. Até breve O amigo