Memórias de um passado saudoso
1972 – 20 de Dezembro, 4ª-feira, 28º. dia de viagem por terras de Angola
Benguela – Mais uma vez de boleia, inicio uma longa viagem por terras de Angola. Parto numa carrinha “Peugeot”, e sigo para o Lobito. Aqui, por indicação simpática e amigável duma jovem estudante, sou dirigido para o melhor local de “apanha boleia”.
Rumo ao Norte, num “NSU”, tentando chegar a todo o custo a Novo Redondo, (Sumbe), mas este tipo de viatura, frágil por sistema, não era o mais apropriado para percorrer grandes distâncias e sob as temperaturas africanas… Daí, a sua avaria mesmo na etapa final que, por sorte, acabámos por ser rebocados até à cidade, por um camião.
Esta povoação, embora sendo a capital do Cuanza Sul, pareceu-me à época, como que um pequeno aglomerado de casario. Centro piscatório, com algumas avenidas ainda por asfaltar, deparou-se-me inferior à grandeza das outras cidades Angolanas. Assim, não me demorei na visita, e num “Jeep”, desloco-me para a próxima cidade onde pretendia visitar mais uma das minhas correspondentes.
Mercado |
Chegado a Gabela, percorri a mesma sem grandes demoras pois, para minha tristeza, não tive a sorte de me encontrar com a desejada cicerone. Nesta, como noutras situações, quando a saudade me batia à porta, recorria às imagens de algum filme projectado nos Cineteatros afamados da localidade. Cinema, Banco de Angola, Mercado, Rádio Clube, Igreja – eram como que pontos de principal referência dos aglomerados urbanos, cidades que correspondiam a pequenas vilas de Portugal.
Cascata do rio Quiéve |
Desta barragem, derivava um canal comprido carregado de água, cuja velocidade de caudal atingia os trezentos quilómetros à hora. De enorme declive, passava por turbinas e despenhava-se num precipício, reencontrando o rio Cuanza espraiado e mais calmo na sua longa planície que o transportava até ao mar, junto a Luanda – Barra do Cuanza.
No fundo da ravina onde o maralhal das águas se entrechocava, fixavam-se os crocodilos ávidos das suas presas já mortas. Aqui, a busca de alimento era fácil de obter. A força e o despenhar das águas ajudava a manter a fauna.
Pela importância estratégica, esta barragem era protegida por militares do exército, e foi o seu capitão que se prontificou a percorrer todo o circuito para me fazer compreender a grandeza de semelhante obra.
Seguindo os morros encurvados da serra – os morros de Salazar, tento chegar e alojar-me no “My Friend”, uma das residências de N´Dalatando. Era esta a residência que mais frequentava aquando das minhas visitas à cidade para namorar a cachopa Angolana. Na altura, fazia dois mil e quinhentos quilómetros por três dias de estadia, e a viagem era feita num “Nord-Atlas” barulhento e num comboio, tipo cobra. Henrique de Carvalho, Luanda, Salazar, Luanda, Henrique de Carvalho.
Já na sexta-feira, de manhã cedo, arranco para Malanje. Mais uma viatura de transporte, “Diane-6”, mais umas largas dezenas de quilómetros e, eis-me na grande e antiga cidade. Esta, foi a que deu guarida ao célebre explorador Henrique de Carvalho, ao famoso “Zé do Telhado”, cuja sepultura ainda era venerada pelos indígenas locais, e ao conhecido Padre Américo.
Sempre em movimento, percorri grande parte das avenidas, jardim, e revi alguns locais por mim já visitados numa outra deslocação que tinha feito por ocasião duns exames a disciplinas do sétimo ano. Aproveitei para visitar plantações de girassol, tabaco e sisal, e não me alongando muito por estas paragens, regresso a Salazar, na ânsia de me reencontrar com a minha correspondente número um, e seus familiares. Estávamos nas vésperas de Natal, e a época era para confraternização.
Cambambe |
Bipartido em ficar em Salazar ou, viajar para Luanda – optei por reaver o meu amigo Zé Soares, na capital – a Luanda dos nossos sonhos…
Dia 24 de Dezembro, deparo-me com o “Bacalhau”, e com grandes abraços, festejámos o encontro e contámos o recheio de aventuras. Estávamos na Ilha - local por todos nós conhecido.
Já no “Pó-pó” da tia, combinámos passar a quadra festiva em casa dos seus familiares – recordação que recentemente despoletámos e que ainda lembramos com imensa saudade.No presente momento, (quadra natalícia), perfazem-se trinta e oito anos após o Natal de 1972, passado em Luanda. Nessa altura, éramos dois jovens entusiastas e aventureiros… Agora… eu, pelo “Putezito” – ele, nos “Brazuca”, no seio da família que nos acolheu. Somos mais velhos…
Por aqui me fico nesta viagem que durou trinta e dois dias, alguns dos quais passados na Capital buliçosa.
Deixo-vos com uma fotografia conseguida na esplanada do sexto andar da Messe dos Sargentos, situada na Avenida dos Combatentes.
Nesse tempo… era assim a Avenida, com os seus carros, prédios – um cheirinho a preto e branco! Uma direcção para os bairros do Marçal e B.O.. Lembram-se?
Luanda, de outrora -- qual a comparação?!
O Majestoso Embondeiro |
Até Breve
O Amigo Vítor Oliveira – OCART