“LESTE DE ANGOLA”
Memórias de um passado
saudoso
EXPLORADORES
PORTUGUESES NA LUNDA
“Em meados de Oitocentos, a zona
central dos mapas do continente africano era um enorme espaço em branco.
Cinquenta anos depois estava preenchida nos seus traços principais. E, breve,
por força de uma súbita competição imperial, sobrepor-se-iam às linhas da
geografia as fronteiras políticas das novas colónias europeias.”
África, contínuo movimento de migração,
combinação e recombinação de genes, de línguas, de princípios culturais e de
organização social, de que foram resultando à luz de circunstâncias locais e
regionais um-sem número de entidades políticas e fronteiras étnicas sempre
efémeras e fluidas.
Havia impérios governados por aristocratas e soberanos
despóticos e que estendiam o seu domínio por enormes áreas. E era de encontro a
esses grandes impérios que as expedições avançavam, porque era esse o seu
objectivo comercial e diplomático ou porque muito simplesmente eles se
encontravam e eram obstáculos aos seus caminhos projectados. Nas Lundas e
região do Cuando Cubango e suas fronteiras, dominavam os impérios do Imbangala,
Cassanje (Malanje) e a Mussumba,
(Lunda Norte). A Norte da Mussumba havia o império Cazembe e, a Sul, depois do
Zambeze, o império do Barotze. Nas Lundas
falava-se Quioco, Bieno, entre
outras línguas.
Os exploradores
que iremos acompanhar neste tema
foram de encontro às capitais dos principais impérios centro-africanos do séc.
XIX.
Em
1831, António Gamito, na tentativa
de ligar o Índico ao Atlântico, alcançou o Cazembe. Por esta altura, Silva Porto, o europeu que porventura
melhor conhecia os caminhos destas regiões de África, esteve várias vezes no
Barotze e em várias zonas do império
Lunda, cuja capital foi visitada por Rodrigues
Graça em 1846, e por Henrique de Carvalho em 1886/7.
Em 4 de Maio de 1846, o explorador Rodrigues Graça parte
para a Lunda, mais propriamente, para o encontro com o Muatiânvua, rei da Mussumba.
Para
enriquecer politicamente a expedição auxiliou-se de D. Ana Joaquina dos Santos Silva, mulher mestiça de ascendência
portuguesa que soubera vingar num mundo de homens, nomeadamente ao enviuvar de um rico
comerciante português. A fama desta abastada proprietária impusera-se no sertão
oitocentista e já era fornecedora do Muatiânvua através dos aliados bângalas de
Cassanje.
Não era pois à toa
que a chamavam de Dembo, ou senhora dos matos.
O destino apontado
por este sertanejo seria a região das Mussumbas, entre os rios Luíza e Calânhi,
embora previsse passar além do reino do Muatiânvua e dar corpo ao lendário
desígnio de ligar Angola a Moçambique – ideia já tentada e preconizada por
António Gamito em 1831 na sua partida por Moçambique.
Traça
o trajecto a sul do Cuango evitando
os embargos do Jaga do Cassanje, sempre arvorado em senhor dessas fronteiras.
aos seus homens, municiados com mais de quinhentos bacamartes e pistolas, que largassem as cargas e formassem três pelotões para cercar Cajanga. Assim conseguiu prosseguir caminho sem necessidade de luta porque o régulo e sua comitiva ficaram intimidados.
Nesta altura, Rodrigues Graça avistou as margens do Cassai na sua trajectória nascente, rumo a leste, julgando tratar-se de um afluente do Zambeze. Desconhecia ainda que este rio descia depois a norte, a cortar a Lunda, para desaguar finalmente no grande Congo
Encontrava-se na
terra dos Quiocos, povo irmão dos Lundas
e empurrados para Sul, subjugados.
Pelo
começo de Setembro de 1846, a expedição de Rodrigues Graça passou o rio Luiza e
cumpriu trezentas léguas de viagem desde o Bié. Nesta ocasião, avistou pela
primeira vez o régulo, imperador Muatiânvua – aquele a quem chamavam de Noeji, de mediana estatura, mais
delgado que robusto, lábios grossos, nariz chato, rosto comprido, cor retinta,
calvo, mas usando peruca.
E
assim se apresentou Rodrigues Graça ao rei da Lunda, Muatiânvua da Mussumba:
“Muatiânvua, perante vós me
apresento como enviado extraordinário de Portugal (Muene Puto), como
embaixador, para comunicar-vos que são veementes desejos do seu governador em
Angola abrir comunicações com o vosso Estado. A fama de vosso nome, bem como de
vossas acções, há muito têm chegado aos ouvidos de Sua Majestade. Eu sou o
órgão por cuja voz o meu governo vos deseja conhecer melhor”.
Em
Janeiro de 1848, Rodrigues Graça regressa a Cassanje. Antes deste sertanejo,
outros de Angola chegaram à região das Mussumbas para fazer negócio na corte do
Muatiânvua, mas foi ele o primeiro português, aliás o primeiro europeu, que
dela deixou um relato escrito.
Silva Porto
conseguiu ao longo do tempo construir no Bié,
em pleno planalto central
de Angola, um pequeno empório, movimentando muitas
mercadorias, muita mão-de-obra e, também, armas para defesa das suas caravanas.
A sua libata de Belmonte, feita de colmo e
adobe, tinha o seu quê de imponente à sombra da bandeira azul e branca e
adquiriu uma reconhecida importância estratégica. Foi em 1842, três anos depois de se iniciar como sertanejo, que Silva
Porto fundou o seu estabelecimento. A ativíssima libata de Belmonte
tornou-se famosa e viria a transformar-se numa cidade. É hoje Kuito, capital da
província do Bié. Durante o regime colonial e até 1975, foi chamada de Silva
Porto.
Em 1852, quando estava na força dos 34
anos – e já com 15 anos em África, foi desafiado a empreender uma viagem. O
governador de Benguela encarregou Silva Porto em 30 de Maio de 1852 fazer a
viagem de Angola a Moçambique, que largou do Bié em 20 de Novembro. Em
Fevereiro de 1853, chegou a Lialui que já tinha sido a capital do império do
Barotze. Este potentado conglomerava politicamente mais de 25 tribos,
estendendo-se por áreas que hoje correspondem a partes da Zâmbia, Zimbabué,
Botswana, Namíbia, Angola e Moçambique.
A 13 de Julho de 1853 Silva Porto encontra Livingstone, no
Barotze.
António da Silva Porto (1817-1890), o veterano do Bié, era o herdeiro e o representante
anónimo da antiga presença comercial dos portugueses na África Austral. Tinha à
sua frente David Livingstone (1813-1873), que então cumpria a primeira das três
grandes expedições a África.
Vindo
da cidade do Cabo, Livingstone tinha atravessado o deserto do Kalahari e
ultrapassado o lago Ngami, alcançando Quelimane e o Índico três anos depois.
Em 1841, Joaquim Mariano e Francisco da Fonseca
já negociavam em Nialele com o rei Riumbo, por ordem de Silva Porto.
Nota: Sobre o grande explorador HENRIQUE DE CARVALHO E A DECADÊNCIA DO
IMPÉRIO LUNDA, leiam “LESTE DE ANGOLA Nº. 12”
Memórias de um passado
saudoso
HENRIQUE AUGUSTO DIAS DE
CARVALHO – Major do Estado
Maior de Infantaria – Explorador (1843
– 1909)
EXPEDIÇÃO À REGIÃO DA
LUNDA, no Leste de Angola, entre 1884 e 1888
PESQUISAS:
“EXPLORADORES PORTUGUESES E REIS AFRICANOS” de Frederico Delgado Rosa e Filipe
Verde, e diversos na internet
Até Breve
O
Amigo