quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

O MAR – A VASTIDÃO QUE NOS ATRAI E NOS REPRIME!


“ Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim.
A tua beleza aumenta quando estamos sós
E tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho.
Que momentos há em que eu suponho
Seres um milagre criado só para mim.”

   

Um dia sonhei ser marinheiro! 
E nessa impossibilidade de o não ter sido, visito o mar com frequência. 
Com um velho amigo, parto de bicicleta todas as sextas
feiras deste limiar ocidental onde habitamos. 
Atravessamos o que outrora foi um mar verdejante…para alcançarmos, por fim, o outro mar --- o Azul. 
No percurso, somam-se recordações saudosas duma infância distante, sentimos os odores da mata queimada, ultrapassamos vezes sem fim as tiras sombrias dos pinheiros esguios e depenados reflectidas no asfalto…espectros ainda de pé! 
Activa-se o corpo, distrai-se a mente e presenciamos o momento, pedalando…

Da terra, chega-se ao mar. E no “cume da cabeça, onde a terra se acaba e o mar começa, e onde Febo repousa no oceano”, ficamos prostrados defronte da vastidão que nos atrai e reprime – o Penedo da Saudade, o Penedo da Duquesa de Caminha.

Aqui, descansamos, saboreamos a nossa fruta, humedecemos os lábios, e conversamos com o nosso amadurecido companheiro “Pelikan”, o pescador de cana. Enfim, o “velho e o mar” que há muito nada pesca. Este, não é o de Cuba, nem o do espadarte. É o velho “Pelikan” de Portugal, onde o peixe também rareia.
Com ele, eis a pergunta acostumada: Que pescaste hoje, “Pelikan”? Ele, hesitante… confessa. Nada, mas tenho peixe!
Horas a fio, retirei a linha do mar, repus o isco, lancei a linha e esperei, esperei. Nada!
Por fim, dois pescadores de barco ao largo do Penedo, ao recolherem as redes, puxaram-me a linha com as mãos, e vendo que não tinha peixe, colocaram na farpa um robalo de quilo e meio. Enfarpado, gritam do mar…puxa, puxa!
O “Pelikan”, rolando o carreto puxou, puxou a amizade oferecida pelos seus concorrentes de pesca. A rivalidade restabeleceu-se e, o pescador da cana refez-se na paz com o pescador da rede. O que um não tirou pescando no cimo, deu-o o outro, lá em baixo.
Partimos, lambendo o corrediço marítimo. E, do farol, pedalámos pelo cimo da Praia da Concha, Praia Velha, serpenteando os pinheiros corcundas…para nos refugiarmos no Old Beach Bar. O “Peter Café Sport”, não o do Faial, mas o do Canto do Ribeiro.
Desta cabana, também se avistam os homens livres marítimos, que percorrem um mundo belo, extenso, sem fronteiras de raça nem de costumes!
Se viajares tu, leitor desta crónica, até ao Canto do Ribeiro e não visitares o “Old Beach”, não vistes os horizontes da Praia Velha …,… velha como nós, já septuagenários!...

A vastidão do mar e a imensidão de idades!



Notas: Versos de Sophia de Mello Breyner Andresen, anotações de Camões, referências a Ernest Hemingay (o Lobo e o Mar) e, ao Peter Bar, no Faial.



Vítor Oliveira